E finalmente aqui está o registro de minha segunda visita à República Federativa de Piápolis, uma ilha localizada na América do Sul onde se fala Português e com graves problemas sociais. A revista do autor Alexandre Garcia é voltada para um público adulto e dá continuidade aos eventos mostrados na edição anterior. Novos personagem surgem e os velhos problemas continuam. As histórias são divididas teatralmente em três atos e um Estásimo. O fio condutor que liga todas as histórias e personagens é a especulação imobiliária com suas consequências sociais. Como foi mostrado antes, a ilha possui uma divisão entre Centro Novo e Centro Velho. O Centro Velho era dominado por uma velha elite que teve seus momentos de glórias no passado e hoje não possui o mesmo poder de antes. Hoje o Centro Velho está decadente e vai pouco a pouco perdendo o espaço para o Centro Novo. Já o Centro Novo é dominado por uma nova elite mais rica, que conseguiu o que queria e, na busca de mais poder, quer também o Centro Velho.
"Cabra, as aventuras(e desventuras) em Piápolis continuam! E não perca a máquina fotográfica! Um Abraço!"
(Alexandre Garcia)
O Primeiro Ato "A (Vã) Conversação" mostra Sotero apresentando para sua família de amigos um projeto para revitalizar o prédio em que vivem. A questão é que o ponto de vista dele é segregativo e entra em conflito direto com seus amigos que possuem um ponto de vista mais humano e inclusivo. Vemos aqui desdobramentos da primeira edição refletirem na família do prédio Florença. Também somos apresentados a uma nova família. A família do Teatro Sagrado Qorpo, da qual Heloísa faz parte. Onde temos um Déjà Vu com um espaço artístico que um dia já foi grande em decadência e pactos com o diabo sendo realizados na esperança de manter o lugar vivo. Desta vez, o Fausto se chama Ísis. O charme das citações e referências literárias e cinematográficas na revista continuam enriquecendo e complementando a história. O filme "Sonata de Outono" de Ingmar Bergman é um bom exemplo disso. Nenhuma citação é gratuita e conhecer as referências torna a leitura muito mais prazerosa.
A melhor adaptação de Fausto com o melhor Mefistófeles de todos os tempos
No Segundo Ato "As Novas Invasões Bárbaras" as cartas das elites do Centro Velho e do Centro novo são postas na mesa e um coringa pode ser decisivo para cartada final deste jogo de poder. Cada jogador joga com as cartas que tem e as pessoas que não estão jogando ficam em segundo plano. Independente do resultado, são estas pessoas que irão perder do mesmo jeito. É mais uma história de apresentação, com um barril de pólvora prestes a explodir, em que os desdobramentos terão sérias consequências em histórias futuras. O Ato Final "Pequenas Esperanças" retoma os problemas vividos por Hélcio tendo que lidar com o seu Mefistófeles e Heloísa com o retorno de um fantasma do passado. Esta a história que mais gosto por dar continuidade ao que aconteceu na edição anterior e por ser de todas as histórias, a que mostra um aspecto mais delicado e humano aprofundando melhor os personagens de Hélcio e Heloísa. Esteticamente também apresenta os melhores desenhos e brinca mais com a narrativa dos quadrinhos. Há um cuidado especial com os personagens de Hélcio e Heloísa nos desenhos e, tanto suas expressões faciais, como as corporais, eles passam mais a sensação de Catarse que nas outras histórias. Por fim, o Estásimo "Dossiê" apresentam as lendas que circulam em torno de João Calegário, o Coringa possivelmente brasileiro deste jogo de poder. Ainda tenho a impressão que os problemas de desenvolvimento de personagens Piápolis continua sendo nos vilões estereotipados. Enquanto o "vilão" do Centro Velho tem um desenvolvimento bem legal, os "vilões" ainda precisam ser menos estereotipados e melhor desenvolvidos. Eu acho o João Calegário os cornos do Lima Duarte e a impressão que tenho com a história é mais de um ator desenvolvendo vários papéis do que uma pessoa que posso acreditar que existe dentro de Piápolis. Vamos ver o que acontece nos próximos capítulos...
Acho que esta imagem ilustra bem o João Calegário
Assim como na revista, coisas mudaram nestes dois anos entre as publicações enquanto outras permanecem as mesmas. Os desenhos estão bem melhores (com destaque especial para o último ato) e a arte-finalização está bem mais limpa (mas ainda apresenta problemas em cenas mais sombrias). A narrativa de quadrinhos deu uma melhorada significativa com o autor brincando mais com as possibilidades narrativas. Seja com quadros dentro dos quadros de quadrinhos na segunda história para retratar o passado ou o requadro cinematográfico do terceiro ato. O problema de letreiramento foi bem resolvido com letreiramento digital nos textos e letreiramento feito à mão pontualmente nos cartazes, revistas e em outros lugares da cidade. Já quanto ao design da revista, feito por Thiago Silva, apresenta o mesmo problema da edição anterior com tudo bem editadinho na parte interna mas uma capa sem diferencial dos outros títulos do Chroma. E pelo conteúdo da revista, o que me vem à cabeça em se tratando de capa é algo na linha estética presente nos posters de filmes feitos pelo artista Benício ou nas capas de quadrinhos do Will Eisner. Crônicas de Piápolis é um dos quadrinhos indepedentes que mais curti ler e que me identifico bastante como artista. Alexandre Garcia tem muita voz e propriedade no quer dizer nestas histórias. É algo que vou amar acompanhar e que espero que tenha um cuidado especial nas próximas edições. E Crônicas de Piápolis é uma publicação que precisa se destacar visualmente na capa em meio a tantas outras publicações não só do Chroma, mas de outros títulos de quadrinhos. Só externamente pois em seu conteúdo já se destaca muito do que tem sido feito por aqui. Estou ansioso para uma terceira visita a Piápolis!
Crônicas de Piápolis- Volume 02
Uma publicação feita em conjunto com o Projeto Chroma e lançada em Dezembro de 2014
Roteiro e Arte: Alexandre Garcia da Silva
Edição, Revisão e Design: Thiago Silva
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